O perfil do brasileiro mudou e a preocupação com a conduta correta dos gestores de patrimônio coletivo se acentuou. Com os recentes escândalos envolvendo corrupção e má administração do serviço público, a sociedade ficou mais atenta ao controle de gastos e a gestão administrativa também da iniciativa privada.

O condomínio, apesar de ser arbitrado por legislação específica, possui aspectos semelhantes aos de uma empresa – administração patrimonial, gestão de pessoas, liderança, regras e obrigações legais, por exemplo. Assim, o condomínio passou a ser questionado por moradores por contas e procedimentos administrativos realizados pelo síndico e pela administradora de condomínio.

A contratação de auditoria pode ser a solução do condomínio para sanar eventuais dúvidas de moradores e mostrar transparência administrativa da gestão condominial. Cabe ao auditor comprovar legalidade, apreciar administração operacional e avaliar resultados.

Para o contador Radjalma Lucena Amorim Júnior, sócio da Pretorian Auditores Independentes, a auditoria verifica a seriedade administrativa e potencializa o uso correto do patrimônio.

“A importância da auditoria em condomínio consiste em assegurar a verificação da lisura de procedimentos e a transparência na gestão financeira, certificando que as contas, tanto de entrada de recursos como de pagamentos de despesas, estejam suportados por documentos hábeis e de acordo com o orçamento aprovado em assembleia. E, como consequência desse trabalho, temos um melhor aproveitamento dos recursos financeiros e segurança aos condôminos, síndico e toda a equipe de que faz a gestão do condomínio”, explica o contador que há 12 anos atua no mercado.

Esta medida positiva gera uma descrição detalhada do comportamento administrativo do síndico e da administradora de condomínio, apontando prováveis casos de irregularidades – como concessão indevidamente de descontos a condôminos inadimplentes, superfaturamento na compra de bens e serviços, possíveis desvios de recursos para uso particular ou predileção por fornecedores específicos, por exemplo.

“O principal objetivo da auditoria é identificar e propor a regularização de eventos equivocados, antecipando-se a situações que possam implicar em prejuízos ao condomínio, e, consequentemente, aos condôminos, e ainda, com o relatório de auditoria poder nortear a aprovação de contas pelos condôminos. Os principais problemas detectados no condomínio são relacionados à ausência de regras de controle interno bem definidas”, explica o contador Sergio Bugelli Sutto, que há 22 anos trabalha no mercado de auditoria em São Paulo.

De acordo com as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC), a auditoria interna compreende os exames, análises, avaliações, levantamentos e comprovações, metodologicamente estruturados para a avaliação da integridade, adequação, eficácia, eficiência e economicidade dos processos, dos sistemas de informações e de controles internos integrados ao ambiente, e de gerenciamento de riscos, com vistas a assistir à administração da entidade no cumprimento de seus objetivos.

É importante salientar que a decisão de contratar auditoria é coletiva e deve ser aprovada em assembleia. Mas, especialistas recomendam que os novos síndicos condicionem o exercício da atividade a prévia auditoria. Desta forma, o novo gestor terá ciência de todo trabalho realizado na gestão de seu antecessor.

E ainda, se o síndico se opuser a tornar o assunto pauta da reunião condominial, o condômino pode criar um abaixo-assinado para ter o assunto em discussão. “Se o síndico se recusar a colocar o assunto em pauta, o morador deve colher um abaixo-assinado com assinaturas de ¼ dos proprietários”, orienta Marcio Rachkorsky, advogado e especialista em condomínios.

De acordo com Radjalma Amorim, os custos são variáveis. “O valor depende de itens como volume de documentos a serem analisados, número de funcionários, número de unidades e o volume de arrecadação do condomínio. Além do tempo coberto pela auditoria e do nível de controles internos. Deve-se destacar que a auditoria emergencial (apurativa) é bem mais cara do que a preventiva em razão de sua urgência na investigação dos fatos e do tempo pretérito em relação aos fatos que serão auditados. Uma auditoria preventiva, ao contrário do que se pensa, pode ser bem acessível para o condomínio, uma vez que o custo para cada unidade pode não ser superior a dez reais mensais”, explica o sócio da Pretorian Auditores Independentes.

Fiscalizadora

A auditoria é um serviço que avalia e fiscaliza a atividade administrativa e contábil, identificando desvios financeiros, fraudes e/ou ações de má gestão. As mais comuns são as chamadas emergenciais, solicitadas por desconfianças de corrupção administrativa que, pelo caráter urgente, são mais caras. Já as preventivas têm valores mais acessíveis e servem de controle prévio da administração.

Para Sergio Bugelli Sutto, administrar um condomínio demanda elevada carga de trabalho e dedicação para que responsabilidades não sejam negligenciadas.

“Os condomínios, assim como as empresas, estão suscetíveis a contingências de natureza fiscal e trabalhista, além de financeiras e outras provenientes de má gestão, sendo o síndico e conselheiros responsáveis perante o Código Civil e os condôminos onerados por eventuais custos inesperados. Neste cenário, as revisões de auditoria, sejam elas realizadas de forma preventiva ou investigativa, são uma valiosa ferramenta para a gestão de condomínios de todos os portes, minimizando os riscos e contingências geradas pelas operações necessárias para a boa gestão”, disse Sutto.

Uma das regras de procedimentos técnicos da NBC é que a auditoria interna deve assessorar a administração da entidade no trabalho de prevenção de fraudes e erros, obrigando-se a informá-la, sempre por escrito, de maneira reservada, sobre quaisquer indícios ou confirmações de irregularidades detectadas no decorrer de seu trabalho.

Prova judicial

De acordo com Sutto, o relatório de uma auditoria pode servir de prova para iniciar um processo judicial. “Nossos trabalhos são permeados por resoluções técnicas (NBC TO 3000, aprovada pela Resolução CFC n°. 1.160/09), que dá base para que o auditor possa emitir sua conclusão sobre o escopo analisado, fundamentado em procedimentos técnicos de auditoria e revestidos da independência profissional. O relatório de auditoria pode sim, balizar uma eventual ação judicial, na comprovação de irregularidades”, argumenta.

A dica de Sergio Sutto para obter um relatório de qualidade é escolher uma empresa responsável e formar uma comissão para acompanhar o trabalho desenvolvido.

“Os trabalhos de auditoria, quando realizados por empresa ou profissional devidamente certificado junto ao órgão de classe, no caso, o Conselho de Contabilidade de sua região, são revestidos de técnicas adequadas e da independência inerente à profissão. É muito importante conhecer pessoalmente o responsável pelos trabalhos e o seu conhecimento sobre o assunto. Uma prática que tem ótimo retorno de qualidade aos trabalhos é a formação de comissão de auditoria (três a cinco pessoas) que acompanhará os trabalhos, dando suporte à administração e ao auditor, e que, dentre outras funções, pode ser a responsável em transmitir os resultados do trabalho aos demais condôminos”, orienta o contador.

Fraude em condomínio

Outra prática irregular, mas comum em todo o Brasil, é o superfaturamento de valores, ou seja, empresas prestadoras de produtos ou serviços fazem, a pedido do síndico ou da administradora de condomínio, o orçamento com valor superior para repassar-lhes parte deste dinheiro.

De acordo com a advogada especialista em Condomínio Tatiana Tomzhinsky, havendo a prática de infrações, o síndico pode ser responsabilizado tanto na esfera cível quanto na esfera criminal.

“As infrações penais mais comuns são a apropriação indébita (se apropriar indevidamente de valores do condomínio) e o estelionato, como por exemplo, de superfaturamento do orçamento para ganhar percentual do serviço. Apropriação indébita pena reclusão de um a quatro anos e multa. Estelionato pena reclusão de um a cinco anos e multa”, explica a advogada, salientando que, concomitantemente a ação penal, o condomínio pode ingressar contra o síndico, na esfera cível, com ação visando a restituição dos valores desviados e a reparação dos danos causados.

Atualmente, a advogada representa um condomínio que entrou com uma ação judicial contra o síndico por suposto superfaturamento em obras. “O conselho fiscal apurou irregularidades nas contas apresentadas pelo síndico. A princípio, na obra que estava sendo realizada no condomínio (superfaturamento) e, após análise minuciosa, verificou-se também apropriação indébita de valores do condomínio. Como o síndico ainda estava cumprindo seu mandato, foi realizada uma assembleia visando destituí-lo e uma auditoria nas contas do condomínio. Atualmente encontram-se em trâmite ações na esfera cível e criminal em face do mesmo. Neste caso específico, foi de fundamental importância a atuação diligente do Conselho Fiscal, que detectou as infrações e irregularidades praticadas pelo síndico na administração das verbas do condomínio”, frisa Tatiana Tomzhinsky, que atua na área de Direito Imobiliário há mais de 15 anos.