Um dos temas mais instigantes, a provocar acesos debates doutrinários e pretorianos, após o advento do Código de Processo Civil de 2015, diz respeito à designação da audiência de mediação, prevista no artigo 334, em sede de ação de despejo, especialmente por falta de pagamento.

Sua realização, como é óbvio, retardará, e muito, a tramitação do processo, causando prejuízo quase sempre irrecuperável para o locador.

Como esta audiência deve ser designada com antecedência mínima de 30 dias, podendo se estender por até dois meses, só começando a fluir o prazo para a contestação, no caso de ser ela frustrada, não será difícil perceber o dano que poderá ocasionar, no caso de não ser purgada a mora.

Uma corrente doutrinária sustenta que, ao determinar sua realização, o legislador processual não excepciona qualquer ação, a não ser quando não se admita a autocomposição, ou quando ambas as partes a rejeitarem.

Além disto, sendo omissa a Lei do Inquilinato, aplicar-se-á, supletivamente, o Código de Processo Civil.

Reconhecemos que estes argumentos são aparentemente sedutores, mas, à nosso aviso, não merecem prosperar.

Em princípio, porque não há que se falar em omissão da lei, tendo nela se criado um sistema rígido e uniforme, que não admite prolongar o processo e que pugna por sua celeridade.

Admitir a designação da audiência de mediação, não significaria suprir uma lacuna e sim rachar o sistema, consolidado há mais de 25 anos e que teve o condão quase mágico de pacificar o mercado, que era antes tumultuado e beirando a violência.

Também é preciso atentar para o princípio da especialidade, já que a Lei do Inquilinato é lei especial, que deve prevalecer sobre a lei geral, que é o Código de Processo Civil.

Não se pode deixar de considerar que, em regra geral, o locador só ingressa com a ação de despejo por falta de pagamento quando já exauridas todas as tentativas de receber seu crédito, o que torna eventual audiência de mediação quase sempre inútil, tendo como único resultado agravar o prejuízo do locador.

Por outro lado, caso seja do interesse do locatário evitar a rescisão do contrato, a lei lhe assegura o direito de purgar a mora, no prazo de 15 dias a contar da citação, o que já representa uma proteção adequada.

O entendimento por nós adotado já vem sendo acolhido por doutrinadores respeitados e pela construção pretoriana, como pode ser verificado pela leitura do Acordão prolatado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, no Agravo de Instrumento n° 2152649-57.2016.8.26.0000, do qual foi Relator o Des. Carlos Trevisan.

Nele se assinala que “a designação de audiência de tentativa de conciliação não está harmonizada com o rito especial da ação de despejo por falta de pagamento previsto no diploma legal supra aludido (a Lei 8245/91), mais ainda porque a decisão agravada alterou o prazo para a purgação da mora e para apresentação da contestação”.

Como se já não bastasse, é relevante considerar que o próprio Código de Processo Civil acena em direção ao princípio da efetividade do processo, ao garantir, em seu artigo 4°, que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

Ao dispensar a audiência de mediação, os juízes estarão preservando o espírito que inspirou a Lei do Inquilinato, que pacificou o mercado, o que é do mais alto interesse social e econômico.

O retardamento da entrega da prestação jurisdicional, nas ações locatícias, é um fator relevante no agravamento das tensões entre locadores e locatários, e foi por isto que a Lei do Inquilinato criou poderosos e inovadores mecanismos para acelerá-la, o que produziu excelentes resultados, justificando sua surpreendente longevidade.

Sylvio Capanema

Advogado e Desembargador aposentado