Entre os diversos projetos que tramitam no Congresso Nacional, propondo alterações para a Lei 8.245/91, merece destaque, a justificar cuidadosa atenção, o Projeto de Lei no 4.571, de 2019, de autoria do Senador Rodrigo Pacheco.

É evidente que após quase trinta anos de vigência, disciplinando um mercado de tamanha densidade social e econômica, como é o da locação de imóvel urbano, a atual Lei do Inquilinato não poderia se manter intacta, imutável, diante das profundas transformações da sociedade brasileira, na última década.

Nada mais razoável e até mesmo necessário, que sejam feitas adequações e reformas, após o advento, nos últimos anos, de novos modelos de contratos de locação, com equações econômicas extremamente sofisticadas.

A sociedade humana está submetida a um permanente processo de mudança, que se reflete na ordem jurídica por ela construída, para disciplinar suas relações interpessoais.

Mas é preciso extremo cuidado para que não se rompa o delicado equilíbrio conquistado com a Lei 8.245/91, e que explica, em grande parte, o milagre de sua longevidade.

O Projeto de Lei 4.571, acima referido, tem por objetivo evidente o de aumentar a liberdade das partes para que estabeleçam as condições do contrato, considerando-se, inclusive, a destinação da locação.

Compreende-se a iniciativa de seu autor em homenagem à recente lei da liberdade econômica, que procura afastar cada vez mais o dirigismo contratual exercido pelo Estado. Já é tempo, portanto, de se reforçar a autonomia privada, para aquecer e alavancar o mercado imobiliário.

É louvável a preocupação mais evidente de flexibilizar o regime da locação não residencial, que não se reveste da mesma densidade social, o que nos parece bastante elogiável.

Desembargador Sylvio Capanema de Souza

Daí se considerarem válidas as cláusulas que autorizem o pagamento antecipado de aluguel, a duplicidade de garantia, bem como a inclusão do negócio processual, a permitir que locador e locatário estabeleçam regras que modifiquem os procedimentos das ações locatícias, agilizando-as ainda mais, o que sempre foi uma preocupação do legislador inquilinário.

Também elogiável é a proposta de definição de permuta, para alienação do imóvel locado, e que afasta o direito de preferência do locatário, em caso de alienação, por este sistema.

Ainda mais conveniente é a previsão de não se admitir a realização de audiências de conciliação nas ações locatícias, à exceção da ação revisional de aluguel.

Atende-se, assim, a antiga e reiterada reivindicação nossa, já que estas audiências, principalmente nas ações de despejo por falta de pagamento, trazem irreparável prejuízo para os locadores, com o retardamento exasperante do processo.

Também merece elogio e incentivo a disposição que autoriza a concessão de medida liminar para desocupação do imóvel, nas ações de despejo por falta de pagamento, não só quando o contrato for desprovido de garantia, como também quando ela se tornar insuficiente ou se exaurir, no curso da locação.

O que nos desperta a atenção e até a curiosidade é a inclusão de regras específicas para a hipótese da locação de imóvel pelo titular de direito de superfície, o que pela vez primeira se trata na Lei do Inquilinato.

Mas há também algum excesso, que não deve prosperar, como, por exemplo, o dispositivo que autoriza a renúncia prévia do direito de preferência, o que rompe antigo e consolidado princípio inerente à locação.

Consideramos válida a iniciativa do projeto, que poderá contribuir para o crescimento do mercado, já que não rompe com os princípios fundamentais que inspiraram a elaboração da lei atual, que permitiu a pacificação social e o aumento da oferta de novas unidades.

O que se recomenda e impõe é que acompanhemos, com redobrada atenção, a tramitação do projeto, para que não seja ele desvirtuado e possa abalar negativamente o equilíbrio que tanto nos custou alcançar.

As entidades que representam o mercado, especialmente o Secovi, a Abadi, a Ademi e a Abami, saberão, como sempre, cumprir o seu papel, mantendo-se atentas e vigilantes, para que o Projeto de Lei realize os ideais que o inspiraram, concedendo um pouco mais de liberdade contratual e econômica, o que por certo permitirá o crescimento e a consolidação do regime jurídico da locação imobiliária urbana, em benefício de toda a sociedade.

 

*Artigo escrito por Sylvio Capanema de Souza, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, atua na advocacia há mais de 35 anos, na área do Direito Imobiliário, tendo sido coautor do contra projeto de lei que resultou na Lei do Inquilinato.